No início do século XX, as reformas urbanas higienistas na área central da cidade empurraram milhares de moradores para o subúrbio e houve uma expansão de bairros em torno das estações de trem. Hoje, o transporte ferroviário é o mais utilizado pelos trabalhadores dessas regiões, mas a Estação de Realengo quando inaugurada em 1878 tinha como principal objetivo o deslocamento de materiais e tropas do Exército e os artefatos da Fábrica de Cartuchos instalados em Realengo.
Foto: Thiago Diniz
O Campo de Marte ou Praça do Canhão, integrava toda essa região de terras realengas, locais públicos que pertenciam ao rei, nos quais eram proibidos arrendamentos e construções, mas eram permitidas atividades como a pastagem do gado. Especula-se que os primeiros habitantes transportavam produtos para comércio até o Porto de Guaratiba, como açúcar, aguardente, álcool e rapadura. Os primeiros registros oficiais de propriedades são de 1814. A partir de 1850, parte das terras foram cedidas ao Ministério da Guerra.
Foto: Thiago Diniz
Essas terras foram consideradas adequadas para treinos militares, alojar pessoal, armazenar material bélico e realização de exercícios de tiro. Houve a criação da Escola Geral de Tiro do Campo Grande (1857-1890), sucedida por outras instituições de ensino do Exército. A Escola Militar foi transferida a partir de 1905 em decorrência do seu fechamento na Urca por causa de envolvimentos com a Revolta da Vacina (1904). Atualmente o prédio abriga a 9ª Brigada de Infantaria Motorizada.
Foto: Arquivo do Exercito Brasileiro
Composição arquitetônica inspirada no estilo romântico, os coretos estão nas praças e jardins de pequenas cidades do interior e nos subúrbios cariocas, representando o centro da vida pública. Ao longo do tempo, foram palanques de campanha política, cerimônias religiosas e outras solenidades cívicas. Nos subúrbios, é muito comum os eventos carnavalescos acontecerem em seu entorno. O Coreto do Campo de Marte é tombado pelo INEPAC (Instituto Estadual do Patrimônio Cultural).
Foto: Thiago Diniz
O Colégio Pedro II está em parte do terreno no qual foi construída a Fábrica de Cartuchos de Realengo (1898-1977), responsável por artefatos bélicos para o Exército. Até o início do século XX, seus geradores forneciam iluminação para a Escola Militar e a Estação de Realengo. Foi incluída nos planos de alguns trabalhadores para a aquisição de armas e munições em favor da luta operária, mas foram denunciados antes da execução. O conjunto arquitetônico e paisagístico é tombado pela prefeitura.
Foto: Thiago Diniz
A urbanização e o comércio em Realengo se desenvolveram com foco em atender as necessidades dos militares, com restaurantes, pensões, alfaiatarias, lavanderias e locações de domicílios. As áreas junto à linha ferroviária pertenciam ao Ministério da Guerra, logo haviam poucas para instalar estabelecimentos do tipo. Isso deu a Realengo uma configuração diferente da maioria dos bairros do subúrbio, nos quais os estabelecimentos comerciais se localizavam normalmente ao redor das estações. Ao invés disso, se expandiu pelo antigo Caminho Imperial, atual Avenida Santa Cruz.
A pedido dos irmãos Manoel e João Fernandes Barata, proprietários da extensa Fazenda Piraquara, uma das mais produtivas da região, foi construída a capela por volta de 1758 e destruída em 1908 por estar em ruínas. Esta é uma reconstrução. O primeiro vigário, o Padre Miguel, foi homenageado com a denominação ao bairro vizinho. A tradição oral conta que a comitiva de Dom Pedro I, em direção a Fazenda Imperial de Santa Cruz, parava na fonte de pedra da capela para saciar a sede dos cavalos.
Foto: Thiago Diniz
No século XX, o cinema se tornou uma manifestação cultural da sociedade industrial e tecnológica e o principal meio de comunicação de massa da propaganda ideológica do governo. Em toda a cidade existiam cinemas de rua como este em estilo arquitetônico art déco. Nos subúrbios eram muito comuns os chamados “cinema poeira”, sem a mesma sofisticação dos localizados no Centro e Zona Sul. Com o passar do tempo desapareceram e muitos se tornaram sedes de igrejas.
Com inauguração prevista para 2024, o Parque de Realengo nomeado Jornalista Susana Naspolini foi reivindicado há anos pelo Movimento Parque de Realengo Verde dos moradores que idealizaram um espaço ecológico, de lazer e cultura no terreno abandonado e em degradação de 142 mil metros quadrados que também pertenceu a antiga Fábrica de Cartuchos. Uma alternativa para a ocupação e preservação do patrimônio que é da população, ao invés de ceder a área para a especulação imobiliária.
Foto: Thiago Diniz
A percepção sobre os viadutos cariocas foi completamente ressignificada nos subúrbios, reinventando com criatividade a ocupação de espaços públicos e transformando-os em polos culturais. O mais famoso exemplo é o Viaduto de Madureira. Em Realengo, desde 2013 é símbolo de luta pelo direito à cultura, ao meio ambiente e à cidade. Nele acontecem encontros de música, arte, grafite, batalha de rimas, skate, oficinas, cineclubes, iniciativas esportivas e práticas sustentáveis.
Foto: Thiago Diniz
O verso “Alô, alô, Realengo” da canção “Aquele Abraço” (1969) do cantor Gilberto Gil popularizou o bairro para o mundo. A composição faz referência ao período em que o artista ficou preso na Vila Militar, distrito de Realengo, nos anos de chumbo da ditadura. Gil foi acusado de desrespeito à bandeira e ao hino nacional. Os militares na prisão cumprimentavam com o bordão “aquele abraço” do humorista Lilico, muito popular na época.
Na década de 1930, existiu o clube Casino de Realengo com uma equipe de futebol feminina considerada por um tempo o maior time carioca de mulheres. A equipe conquistou patrocínios e estreou o futebol feminino na inauguração do Estádio Municipal do Pacaembu, até então o maior do país. O jogo repercutiu na imprensa e sofreu discriminações. Mais de um ano após a partida, as críticas ocasionaram a proibição do futebol feminino no país que durou até 1979.
Em 1894, no Campo de Marte (atual Praça do Canhão), o brasileiro Augusto Severo de Albuquerque Maranhão construiu o balão dirigível Bartholomeu de Gusmão, o primeiro semirrígido do mundo, com 60m de comprimento. Com a ajuda do engenheiro Lachambre, um dos maiores construtores de balões da França, realizou experiência de ascensão e a aeronave chegou a subir 8 m de altura. Não obteve o êxito esperado, mas foi o ponto de partida para outros projetos.
Na Rua Carumbé, n° 713, o Bazar Peter Pan está conectado com a tradição dos carnavais de rua do subúrbio, com a venda de diversos artigos que compõem essa identidade festiva. Miçangas, paetês, muitas fantasias e adereços de bate-bolas. Muito frequentado, a importância desse comércio para a cultura local fez com que o proprietário Hélio recebesse o título de Presidente do Quartel General dos bate-bolas.
Terreiro de Crioulo, situado na Rua do Imperador, 1075, é uma roda de samba tradicional que busca enaltecer os grandes mestres do Partido Alto e o Samba de Terreiro, com muita feijoada! Em 2022 recebeu a Medalha de Mérito Cultural Alcione.
Foto: Terreiro de Crioulo
Para contemplar a natureza, a partir da Rua do Governo pode-se chegar ao Aqueduto (um trecho de 350 metros de extensão) e a Cachoeira do Barata, no Parque Estadual da Pedra Branca, uma das maiores florestas urbanas do mundo! De lá é possível ter uma visão fascinante de Realengo.
Localizado na Rua Marechal Joaquim Inacio, s/n, o Espaço Cultural Arlindo Cruz recebe shows musicais, espetáculos e oficinas de teatro e dança, entre outras atividades.
Restaurante clássico da região, com self-service e boa comida, é um dos pontos de encontro dos moradores de Realengo.