O bairro de Oswaldo Cruz, na zona norte do Rio de Janeiro, é marcado pelo seu aspecto residencial muito característico do subúrbio carioca. Formado em torno da antiga Estação Ferroviária de Rio das Pedras, detém uma forte presença cultural afro-brasileira e é berço de uma das mais tradicionais agremiações carnavalescas de nosso país, a centenária escola de samba Portela, de enormes contribuições ao Carnaval e à Música Popular Brasileira.
A importância dessa escola de samba para a cultura da cidade inclusive é reconhecida através de uma lei municipal, que reconhece a área em torno da Portela e os endereços mais importantes para a história da agremiação como uma área de interesse cultural, o chamado Perímetro Cultural de Oswaldo Cruz, criado pela Lei Municipal nº 6.483/2019.
Nesse Rolé, faremos um percurso por esse espaço. Logradouros, mobiliários urbanos e espaços culturais serão recursos para compartilhar narrativas sobre o valor histórico e cultural deste território tão fundamental para a cultura do Rio de Janeiro.
Inaugurada em 1898, a estação ferroviária da região foi batizada de Rio das Pedras, numa referência ao rio que cortava a região. A comunidade no entorno da parada do trem experimentou um grande crescimento a partir de dois grandes movimentos migratórios entre o fim do século XIX e o princípio do século XX. O primeiro com os ex-escravizados vindos da região do Vale do Paraíba no pós-abolição e o segundo com os contingentes expulsos do Centro do Rio de Janeiro depois das reformas urbanas do Prefeito Pereira Passos. Grande parte desses contingentes era composto por pretos e pobres, que trouxeram consigo suas práticas culturais, o que está na raiz da forte presença cultural afro-brasileira que hoje é uma das marcas registradas da região.
Importante liderança da região no início do século XX, Esther Maria Rodrigues abrigou em sua casa grandes reuniões e festas da comunidade onde os jongueiros e sambistas se encontravam e organizavam para levar à rua suas manifestações culturais. As reuniões contavam ainda com a presença de políticos e empresários influentes. Localizada na rua Antônio Badajós, número 95, a casa de Dona Esther foi frequentada por figuras como Donga, Pixinguinha, Ismael Silva e Paulo da Portela, entre outras artistas fundamentais para o samba e para o carnaval carioca.
Uma das principais vias de circulação da região de Madureira e Oswaldo Cruz, a estrada foi batizada em referência ao antigo Engenho do Portela, uma das grandes propriedades rurais desmembradas no processo de formação do bairro de Oswaldo Cruz. O Engenho do Portela era limítrofe às terras de Lourenço Madureira, que viriam a batizar o bairro vizinho.
Situada na Estrada do Portela, número 446, a Portelinha foi uma das primeiras sedes da Escola de Samba Portela. Depois de funcionar nas casas de alguns de seus fundadores e no Bar do Nozinho, ponto de encontro de sambistas da região, a Portela finalmente conseguiu ocupar um local com o fim específico de ser a sua sede. Erguida em fins da década de 1950, a Portelinha representou a primeira sede própria da Escola. Uma grande conquista para a agremiação e uma grande construção coletiva visto que ela contou com o trabalho e contribuições da comunidade e de doações de nomes famosos da região, como o Ministro do Tribunal de Contas de Getúlio Vargas, Edgard Romero.
A Praça Paulo da Portela é batizada em homenagem a maior liderança popular da história da região. Paulo Benjamin de Oliveira nasceu em 1901, no bairro da Saúde. A partir das reformas urbanas do início do século XX, morou entre outros locais até se estabelecer em definitivo na região de Oswaldo Cruz, onde participou de várias agremiações carnavalescas que acabariam por formar a Escola de Samba Portela. Além disso, era um compositor inspirado, autor de clássicos do samba que já entraram para a história.
Fundado em 1982, o Bloco Afro Agbara Dudu é celebrado como uma das mais representativas entidades do movimento negro na luta contra o racismo no Rio de Janeiro. Seu nome, vem do Iorubá e, numa tradição livre, significa algo como força negra ou poder negro. Entre seus fundadores estão figuras de destaque no movimento negro no Rio de Janeiro, como Reginaldo da Portela e Vera Mendes, a Vera do Agbara. Seguindo a tradição de outros blocos afro, como o Olodum e o Araketu o bloco tem uma atuação que vai muito além do carnaval, promovendo debates, atos políticos, oficinas e cursos.
A rua que sedia a atual quadra da Portela foi renomeada em 1983 como Rua Clara Nunes, em homenagem à cantora mineira que migrou para o Rio de Janeiro e se apaixonou pelo samba e por essa escola, na qual gravou sambas de quadra e enredo. Sua trajetória musical é marcada pela conexão com esse gênero musical e as religiões de matriz africana.
Inaugurada em 1972, o Portelão é a sede oficial do GRES Portela, onde realiza a maior parte das suas atividades, principalmente shows, rodas de samba, cortes de samba-enredo e ensaios. O lendário Natal, liderança histórica da Portela e da região de Oswaldo Cruz e Madureira, juntamente com o presidente Carlinhos Maracanã, ergueu, no antigo terreno de uma empresa de ônibus, a sede da Escola, considerada imponente e moderna para a época.
O Trem do Samba é um evento tradicional criado para celebrar o Dia Nacional do Samba (2 de dezembro). A primeira edição ocorreu em 1996, inspirada nas viagens realizadas pelo sambista Paulo da Portela e seus amigos, os quais se reuniam na estação Central para pegar o trem que partia às 18h04. No trajeto, ensaiavam até desembarcar na estação Oswaldo Cruz. Atualmente, o evento reúne sambistas e fãs do gênero que realizam o mesmo percurso. Durante a viagem, os vagões se transformam em palcos para apresentações. No destino, a celebração continua espalhada pelo bairro, com shows de grandes artistas.
Patrimônio Cultural e Imaterial do Rio de Janeiro, a Feira das Yabás (do iorubá “mães” ou “rainhas”) é um evento criado em 2008 com o objetivo de celebrar a cultura afro-carioca. Acontece todo segundo domingo do mês na Praça Paulo da Portela. Na feira são destaques a gastronomia e o samba, com barracas comandadas por matriarcas de famílias tradicionais do bairro que fazem uma releitura dos famosos "almoços de quintal" que, desde o início do século XX, uniam comida e samba nos domingos.
A Portela é a escola de samba mais antiga em atividade contínua e a única que esteve presente em todos os desfiles da cidade, sendo a maior campeã com 21 títulos. Sua reputação alcança o cenário internacional: em 1941, Walt Disney visitou sua quadra acompanhado de seu desenhista oficial, o que leva muitos a acreditarem que o personagem Zé Carioca foi inspirado nos moradores boêmios de Oswaldo Cruz, bairro que é berço da escola.
O bairro Oswaldo Cruz recebe essa denominação em homenagem ao médico e sanitarista que realizou grandes contribuições para a história da saúde pública brasileira. Oswaldo Cruz foi responsável também por liderar a campanha de vacinação obrigatória contra as principais doenças do início do século XX, o que ocasionou na Revolta da Vacina (1904), no contexto das reformas urbanas do prefeito Pereira Passos. Essas reformas foram responsáveis pela remoção violenta da população da área central, expulsa para as áreas dos subúrbios cariocas, como o bairro que o homenageia. Curiosamente, enquanto o bairro reverencia seu nome, há uma carência de homenagens às personalidades locais que ajudaram a construir a identidade e a história do lugar.
Na série “Rolé Visita”, do canal do YouTube do Rolé Carioca, é possível assistir o vídeo “Rolé Visita Portela” que explora a história de uma das escolas de samba mais queridas do Rio de Janeiro e que desempenhou um papel histórico muito importante no desenvolvimento do carnaval carioca.
A história do bairro Oswaldo Cruz é marcada pela cultura afro-brasileira e as raízes do samba. O livro “Breve História do Samba Carioca”, do historiador Mauro Sérgio Farias, faz uma abordagem do surgimento do samba no início do século XX até os dias de hoje. Ideal para apreciadores do gênero que desejem conhecer sobre sua origem e trajetória, bem como para educadores e estudantes que busquem trabalhar com a temática "História e Cultura Afro-Brasileira", conforme prevê a Lei 10.639/2003
"Rio, Zona Norte" (1957), é um filme dirigido por Nelson Pereira dos Santos que mergulha nos bastidores do universo do samba na periferia do Rio de Janeiro, mostrando a luta, o talento e a garra de personagens ligados a esse gênero musical.